O segundo dia do seminário internacional “30 anos da Constituição de 1988” trouxe ao plenário do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCM), na manhã desta terça-feira (06/11), questões relacionadas aos “Direitos não efetivados nos 30 anos da Constituição brasileira”. Entre os convidados para falar sobre o assunto estiveram presentes o diretor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e professor catedrático, Eduardo Vera-Cruz, e o advogado e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Pedro Serrano.
A abertura do evento contou com a presença do presidente do TCM, conselheiro João Antonio, que, ao discorrer sobre o tema, sugeriu um debate sobre o positivismo jurídico, modelo adotado pelo Brasil em seu ordenamento.
“Em minha fala, provoco os debatedores para analisar o artigo 3º da Constituição do Brasil, que diz: ‘Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II - garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação’. Esse artigo estabelece como futuro de nação um projeto ousado. Ele está longe de ser alcançado”, destacou o presidente do TCM.
Segundo o professor Eduardo Vera-Cruz, historicamente o direito resulta de alguém com saber socialmente reconhecido que diz o porquê ganha-se ou perde-se algo. “Para haver Estado de Direito, o direito constitucional não pode continuar dizendo que o poder constituinte originário é o início de todas as preocupações democráticas”.
Desse modo, para o professor, o direito deve inspirar a lei de tal maneira que o futuro seja pensado além da Constituição. “A lei é uma decisão política. O jurista tem de fazer muito mais do que interpretar a lei”, afirmou. “Olhe para mim como uma pessoa humana que nasceu cheia de direitos. Não interessa onde nasci”, completou o diretor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa ao interpretar a Constituição como produto da história.
Contrapondo-se à ideia do professor Vera-Cruz, Pedro Serrano defendeu a tese de que o centro do direito é a decisão jurídica. “Sempre nos negamos a ingressar no conteúdo moral que habita as normas jurídicas. A realidade é que as condições do pós-guerra realizaram decisões politicas morais de conteúdo. Elas são insuficientes”, pontuou ele.
Professor da PUC-SP, Serrano explicou de modo didático sobre as duas formas de se pensar o direito: “O direito fundado na lei traz a ideia do racionalismo. É o direito fundado na razão acima da realidade. Isso é o que dá condições para projetar o futuro e as coisas no mundo real. Um grande exemplo disso é a Revolução Francesa. Outra forma é o direito tratado na tradição, na história. É operar no ambiente do comum, do comunitário”, explicou.
Considerando que o direito brasileiro é pautado no positivo, no futuro, o professor reconheceu que temos um país com problemas e dificuldades próprias, e que temos que tentar achar um caminho para a solução. “Não temos passado. Temos um direito transplantado. Nosso coração só tem vileza. O brasileiro branco não vê no negro um parceiro, por exemplo, ele vê no negro uma raça inferior. As formas de distribuição da riqueza no Brasil são extremamente simbólicas. O negro foi completamente excluído da riqueza simbólica. Não há dúvidas porque nossas primeiras Constituições democráticas expressavam isso. Criava-se a ideia de raças inferiores e superiores, excluindo do direito a educação e tratando-os como inferiores”, lamentou Serrano.
Por fim, o professor brasileiro afirmou que cabe a nós “acreditar no futuro, pois somos um país-criança”, que deve prezar por uma pauta de valores morais baseados em Direitos Humanos.
Presidente do TCMSP, conselheiro João Antonio da Silva Filho.
Diretor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e professor catedrático, Eduardo Vera-Cruz.
Maria Fernanda Pessatti de Toledo, da Assessoria Jurídica do TCM, foi mediadora do evento.
Advogado e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Pedro Serrano.
O segundo dia de seminário lotou o plenário do Tribunal de Contas do Município de São Paulo pela manhã.